03/08/2017 - 13:35 | última atualização em 03/08/2017 - 16:13

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"Vivemos em um Estado Policial e interventor", avalia delegado

redação da Tribuna do Advogado

Foto: Bruno Marins   |   Clique para ampliar
O cenário de crise da segurança pública no Rio de Janeiro foi o mote do evento que a Comissão de Política Criminal e Penitenciária (CPCP) da OAB/RJ realizou na noite desta terça-feira, dia 2, na sede da Seccional, reunindo especialistas para debater o conceito de Estado de Polícia e como, hoje, a forma como a segurança pública é tratada no país reflete no alcance da democracia.
 
Na opinião do delegado da Polícia Civil Marcos Amim, o Estado de Polícia - conceito entendido como o tipo de organização estatal fortemente baseada no controle da população por meio da polícia política, das forças armadas e outros órgãos de controle ideológico e repressão política – é uma realidade no Brasil: “Vivemos em um Estado policial, interventor e que carrega um discurso que ajuda a classe política a tratar a segurança pública hipertrofiando cada vez mais as instituições, de forma que o maior prejudicado é o cidadão, independentemente de ele estar em conflito com a lei ou não”.
 
Ele ressaltou que a sensação de insegurança não é uma ficção: “Mas tudo isso é fruto de uma política de segurança que preza o policiamento ostensivo, a viatura na rua, a presença de policiais fardados. É uma política de segurança voltada a atender o cidadão leigo, que quer tratar segurança pública com o viés de segurança privada”.
 
O delegado explicou: “O que temos em nossas casas para aumentar a sensação de segurança? Muro alto, guarida, em alguns casos, segurança privado. Essa ideia é transferida para a segurança pública por políticos que não querem resolver de fato o problema. Não é que a polícia na rua não seja necessária: ela é essencial, é uma questão de ordem pública. Mas é impossível combater crime organizado com patrulhamento ostensivo, isso não ocorre em nenhum lugar do mundo”.
 
Juiz de direito de São Gonçalo, região que esteve em foco nos noticiários pela prisão, em junho, de 96 policiais militares acusados de recebimento de propinas e venda de armas, em uma operação nomeada como Operação Calabar, organizada pela Divisão de Homicídios de Niterói, ltaboraí e São Gonçalo, André Nicolitt também ressaltou, em seu discurso, o problema do cenário político atual, e denunciou uma crise na legalidade:
 
“Estamos vivendo em um estado de barbárie”, disse Nicolitt, observando que se referia, com isso, a uma ideia de falta total de leis. “Sabemos que nem todos seguirão o Estado Democrático de Direito, e é por isso que há um arcabouço jurídico em um Estado. Mas o que assombra é quando o próprio Estado resolve abandonar a ideia do Estado Democrático de Direito. Os próprios poderes abandonaram. E quando isso acontece não nos sobra mais nada. A aplicação da lei, hoje, é algo episódico.
 
Para ele, não há como relacionar a violência à desigualdade social que assola o país: “É difícil fazer com que as pessoas incluídas, abastadas, entendam que, enquanto houver essa desigualdade profunda e que vai aumentar  ainda mais com as reformas trabalhista e previdenciária, nós nunca vamos viver em condições mais pacificas, de menos violência”.
 
Foto: Bruno Marins   |   Clique para ampliar
Já os problemas quando se diz respeito à aplicabilidade da lei – e ao Poder Legislativo que as formula – foram apontados pelo defensor Público do Estado de Rio de Janeiro Emanuel Queiroz Rangel. Entre um dos textos legais trazidos por Rangel para análise dos presentes estava o próprio Código de Processo Penal.
 
“Temos um Código de Processo Penal de 1941 ainda vigente. Ele já foi ultrapassado por Constituições mas, surpreendentemente, nem com a Constituição de 1988 houve mudança fundamental nele, em sua carga principiológica. Ou seja, tivemos o advento de todo um arcabouço normativo que trouxe o principio acusatório e rechaçou o principio inquisitorial, em que se baseia o Código de Processo Penal, mas, na realidade, nada mudou. Permanecemos em um sistema inquisitorial e isso é pernicioso para se alcançar o Estado Democrático de Direito”.
 
Participaram também do evento o delegado de Polícia Civil Fábio Baruke, e o advogado criminalista e membro da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da OAB/RJ Flavio Augusto Campos Fernandes. O presidente do grupo, José Pinto Soares de Andrade, presidiu a mesa.
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