03/04/2014 - 10:53

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STF vota contra contribuição de empresas às campanhas

jornal O Globo

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou ontem pela proibição das doações de empresas a partidos políticos e candidatos em campanha, o que poderá reduzir drasticamente os custos oficiais das eleições. Embora a maioria já esteja assegurada (6 a 1 entre 11 ministros), o ministro Gilmar Mendes pediu vista, adiando a conclusão do julgamento. Não há prazo para o julgamento ser retomado e a mudança pode não valer para a eleição deste ano.
 
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado fez ontem esforço no mesmo sentido: aprovou projeto de lei, em caráter terminativo, que põe fim às doações eleitorais de empresas. Se não houver recurso para o plenário, o projeto seguirá direto para a Câmara. A proposta só será aprovada em tempo hábil para vigorar nas eleições de outubro se os parlamentares conseguirem priorizar o tema.
 
O julgamento do STF começou em dezembro do ano passado e foi interrompido quando havia quatro votos contrários a doações de empresas. A discussão foi retomada ontem com o voto de Teori Zavascki, que defendeu a continuidade da norma atual, que permite a participação financeira de pessoas jurídicas nas campanhas.
 
Até agora, se manifestaram contra as doações de empresas os ministros Luiz Fux, relator do processo; Joaquim Barbosa, presidente do tribunal; Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio Mello, que também é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Ricardo Lewandowski. Antes de pedir vista, Gilmar Mendes deu a entender que votará como Teori Zavascki.
 
A polêmica foi suscitada por Ação Direta de Inconstitucionalidade da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que questiona a parte da legislação eleitoral que dá às pessoas jurídicas o direito de doar a candidatos valores correspondentes até 2% do faturamento bruto do ano anterior ao da eleição. A ação também quer derrubar o dispositivo que autoriza pessoas físicas a doarem até 10% de seus rendimentos. Para a OAB, o TSE precisa limitar um valor numérico como teto das contribuições de pessoas naturais, e não percentual.
 
A única parte da lei que não foi questionada é o Fundo Partidário, que financia parte das atividades dos partidos com dinheiro público. Dos ministros que votaram pelo fim das doações de empresas, apenas Marco Aurélio negou o pedido na campanha de rente às pessoas físicas. Ele também foi o único a deixar claro que a regra já teria validade para este ano, se o julgamento for concluído antes das eleições. O começo da vigência da norma será definido pelos ministros ao fim do julgamento.
 
"As pessoas jurídicas não votam e não podem ser eleitas. Daí porque não há a menor razão em existir participação no processo eleitoral. Elas defendem interesses materiais, incompatível com a aspiração de aprimorar o bem comum que promana do somatório dos votos individuais dos cidadãos", argumentou Lewandowski.
 
Para Marco Aurélio, presidente do TSE, a influência excessiva do dinheiro nas campanhas promove desigualdade. Ele concluiu que, por meio de doações, as empresas acabam ditando, indiretamente, os rumos da política no país. "O poder financeiro acaba tendo influência negativa nas decisões políticas do país. O valor político é substituído pela riqueza das empresas doadoras, que controlam o processo político. A elite econômica brasileira, por meio de ações puramente pragmáticas, modela as decisões de governo e as políticas públicas prioritárias, além de contribuir para a debilidade ideológica de nosso sistema partidário", afirmou.
 
Para Teori Zavascki, proibir as empresas de contribuir com as campanhas não vai diminuir a corrupção, porque serão encontradas formas ilegais de financiamento para burlar a lei. Ele defende a limitação dos valores de doações, em vez do banimento delas: "O antídoto para gastos excessivos de campanha eleitoral não é declarar a inconstitucionalidade de doações. A solução mais plausível será a imposição de limites de gastos".
 
Embora tenha pedido vista sem votar oficialmente, Gilmar Mendes deu sinais de que concorda com Zavascki. Ele explicou que os partidos grandes, que já têm recursos disponíveis, só precisarão arranjar pessoas para dizer que fizeram as doações. Seria uma forma de driblar formalmente o banimento das doações de empresas.
"A exigência de que haja apenas a participação de cidadãos no financiamento não vai resolver logo a questão. Os partidos que estão no poder e que já têm recursos só precisam de mais algumas centenas de milhares de CPFs para novas distribuições. Certamente haverá pessoas pobres que doarão seu salário, porque receberão dinheiro para isso. Basta ver o fenômeno de doação para saber como isso opera. Os partidos que tiverem base de raiz vão operar com essa lógica e já operam", afirmou.
 
Mesmo com o voto já expresso no ano passado, Fux e Barroso reforçaram seus pontos de vista na sessão de ontem. Fux ressaltou que a participação de empresas no processo eleitoral não é ideológica, já que elas muitas vezes contribuem com partidos de bandeiras opostas. Barroso voltou a criticar o modelo eleitoral vigente:
"Do modo como o modelo é estruturado, não se consegue atrair para a política nenhuma nova vocação. O ingresso na política se dá ou de forma hereditária ou mediante compromisso com patrocinador. Vivo a crença de que faz parte do meu papel condenar um modelo que arruina a médio e longo prazo as instituições. Tenho dificuldade de ficar inerte diante de um modelo que todos nós achamos péssimo".
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