02/04/2009 - 16:06

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Relator vota contra Lei de Imprensa

Relator vota contra Lei de Imprensa


Do jornal O Globo

02/04/2009 - Dois dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram ontem pela revogação total da Lei de Imprensa, que é da época da ditadura militar. Em seu voto, o relator, Carlos Ayres Britto, fez uma veemente defesa da liberdade de expressão e considerou toda a lei inconstitucional. Em seguida, o ministro Eros Grau concordou com o colega. Foi o primeiro dia do julgamento da ação proposta pelo deputado Miro Teixeira, em nome do PDT, contra a lei. Para o parlamentar, a Lei de Imprensa, de 1967, é uma forma de calar a imprensa, pois impõe sanções severas a eventuais abusos cometidos. A decisão final do STF é aguardada para o próximo dia 15, quando a discussão será retomada.

Ayres Britto ressaltou todos os trechos da Constituição que garantem o exercício "pleno e livre" da liberdade de expressão. Também citou a célebre frase do ex-presidente dos Estados Unidos Thomas Jefferson: "Se tivesse que decidir se devemos ter governo sem jornais ou jornais sem governo, eu não vacilaria um instante em preferir o último".

"Em matéria de imprensa, não há espaço para o meio-termo ou a contemporização. Ou ela é inteiramente livre, ou dela já não se pode cogitar senão como jogo de aparência jurídica. É a trajetória humana, é a vida, são os fatos, o pensamento e as obras dos mais acreditados formadores de opinião que retratam sob todas as cores, luzes e contornos que imprensa apenas meio livre é um tão arremedo de imprensa como a própria meia verdade", disse o ministro no voto.

Ele lembrou que a Lei de Imprensa foi editada em 1967 para inibir a liberdade dos órgãos de comunicação: "Se nenhuma lei pode ir além do que já foi constitucionalmente qualificado como "livre" e "pleno", a ideia mesma de uma lei de imprensa em nosso país soaria aos ouvidos de todo e qualquer operador do Direito como inescondível tentativa de embaraçar, restringir, dificultar, represar, inibir aquilo que a nossa Lei das Leis circundou com o mais luminoso halo da liberdade em plenitude", ponderou.


Tratamento igual para todos, defende

Ayres Britto chamou atenção para trechos da Lei de Imprensa de conteúdo penal, como os artigos que tratam dos crimes contra a honra: calúnia, injúria e difamação. Na lei, as penalidades para essas práticas são mais severas do que as punições previstas no Código Penal. O ministro afirmou que jornalistas e meios de comunicação não podem ser tratados de forma mais rígida que o restante da sociedade.

Se o voto de Ayres Britto for seguido pela maioria dos ministros, valerão para jornalistas e órgãos de imprensa as punições do Código Penal. "A lei não pode distinguir entre pessoas comuns e jornalistas para desfavorecer penalmente estes últimos, senão caminhando a contrapasso de uma Constituição que se caracteriza, justamente, pelo desembaraço e até mesmo pela plenificação da liberdade de agir e de fazer dos atores de imprensa e dos órgãos de comunicação social", alertou o relator.

O ministro atentou para a importância de haver punição, penal ou civil, para eventuais abusos da imprensa. No entanto, ele condenou os abusos nos pedidos de indenização feitos por figuras públicas: "Quando o agente estatal não prima por todas as aparências de legalidade e legitimidade no seu atuar oficial, atrai contra si mais fortes suspeitas de comportamento antijurídico. O que propicia maior número de interpelações e cobranças em público, revelandose claramente inadmissível que semelhantes interpelações e cobranças, mesmo que judicialmente reconhecidas como ofensivas, ou desqualificadoras, venham a ter como sanção indenizatória uma quantia tal que leve ao empobrecimento do cidadão agressor e ao enriquecimento material do agente estatal agredido".

O ministro Eros Grau limitou-se a concordar com o relator. Os outros nove ministros votarão no dia 15. A ação de Miro Teixeira contra a Lei de Imprensa foi ajuizada em fevereiro de 2008. Dias depois, Ayres Britto concedeu liminar para suspender 20 dos 77 artigos da lei - inclusive os referentes às punições a jornalistas condenados por crimes contra a honra.

Por isso, se atualmente algum profissional da imprensa cometer esses crimes, será punido pelo Código Penal. Essa liminar foi confirmada pelos outros dez ministros, em votação plenária. Até o fim do julgamento de mérito, a liminar será mantida.


Fenaj pede derrubada parcial

O presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Sergio Murilo de Andrade, se declarou contrário à revogação total da lei: "Defendemos que os artigos declaradamente inconstitucionais sejam revogados, mas o restante do texto deve ser mantido, até que o Congresso cumpra seu papel e vote novo texto, mais moderno", disse.

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