16/02/2012 - 10:08

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Nova ministra do STF vota pela Ficha Limpa

jornal O Globo

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir nesta quinta-feira, dia 16, que a Lei da Ficha Limpa poderá ser aplicada já nas eleições municipais deste ano. Ontem, o plenário da Corte tentou concluir o julgamento do assunto pela terceira vez, mas a decisão foi adiada para hoje. Por enquanto, há quatro votos pela constitucionalidade da lei e um pela inconstitucionalidade. Seis ministros ainda vão se manifestar. A tendência é que a maioria dos integrantes aprove a validade da norma.
 
Nesta quarta, o ministro Dias Toffoli foi o primeiro a votar. Ele considerou inconstitucional o principal artigo da lei: o que torna inelegíveis políticos condenados por um tribunal colegiado, mesmo que ainda seja possível recorrer da decisão. Segundo o ministro, a norma fere o princípio constitucional da presunção da inocência, segundo o qual uma pessoa só pode ser considerada culpada após o trânsito em julgado da condenação - ou seja, quando não houver mais possibilidade de recurso judicial da sentença.
 
"Se a pena criminal não pode ser aplicada provisoriamente, como poderá ela surtir efeitos eleitorais?", questionou Toffoli.
 
Em seguida, os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso aproveitaram para atacar a Lei da Ficha Limpa, apesar de ainda não terem votado formalmente. Gilmar afirmou que boa parte das sentenças criminais é mudada no julgamento de recursos. Portanto, seria uma injustiça impedir a candidatura de alguém com base em uma decisão reversível. Celso de Mello concordou.
 
"É necessário banir da vida pública pessoas desonestas e improbas, mas, de qualquer maneira, é preciso respeitar as regras da Constituição", ponderou Mello.
 
O ministro Luiz Fux, o relator, que já votou a favor da aplicação da lei, tentou defender sua posição.
 
"A opção do legislador foi a de que um cidadão condenado mais de uma vez não tem merecimento para transitar na vida pública brasileira. O tribunal não pode ser contramajoritário para ir contra a população. A população não nos pauta, mas nós temos que ouvi-la. Todo poder emana do povo e em seu nome é exercido", disse.
 
"A rigor, a Corte pode e deve decidir contra a vontade popular, porque, se não, a pena de morte seria aprovada. O modelo contramajoritário protege o indivíduo contra si mesmo. Aplaudem-se os esquadrões da morte, mas isso é contra qualquer padrão civilizatório. Nós temos um papel didático de fazer valer o Direito, às vezes, contra a opinião popular".
 
Toffoli manteve válido, no entanto, o artigo que torna inelegíveis políticos que renunciaram do cargo eletivo para escapar de processo de cassação. Ele também concordou com a regra que impede a candidatura de pessoas que tenham sido condenadas administrativamente por conselhos profissionais por faltas éticas, desde que não haja mais possibilidade de recurso da condenação.
 
"Nem os regimes autoritários ousaram editar norma punindo fatos passados. É muito fácil descobrir qual é o universo de pessoas que se quer atingir pela descrição dos fatos. Essa previsão suprime a responsabilidade ética, porque a pessoa já não tem alternativa de evitar o fato censurável. O cidadão não tem mais alternativa para evitar, ele vai sofrer de qualquer maneira a sanção, não tem jeito", protestou Peluso.
 
Em seguida, Rosa Weber e Cármen Lúcia votaram pela aplicação da lei. Para elas, o princípio da inocência é aplicado apenas a processos penais, não à legislação eleitoral. As ministras argumentaram que inelegibilidade não é uma forma de punição, apenas uma condição a ser observada no momento do registro da candidatura.
 
"O homem público, ou que pretende ser público, não se encontra no mesmo patamar de obrigações do cidadão comum no trato da coisa pública. O representante do povo, o detentor de mandato eletivo, subordina-se à moralidade, à probidade, à honestidade e à boa-fé, exigências do ordenamento jurídico e que compõem um mínimo ético, condensado pela Lei da Ficha Limpa, através de hipóteses concretas e objetivas de inelegibilidade", disse Rosa, a mais nova integrante da Corte.
 
Em novembro, Luiz Fux defendeu a constitucionalidade da lei, mas propôs uma pequena mudança para reduzir o tempo que uma pessoa pode ficar inelegível quando condenada. Pela Lei da Ficha Limpa, esse tempo é de oito anos, contados após o cumprimento da pena imposta pela Justiça. O ministro sugeriu que seja debitado dos oito anos o tempo que o processo leva entre a condenação e o julgamento do último recurso na Justiça.
 
Na Lei da Ficha Limpa, a perda dos direitos políticos é contada a partir da condenação, ainda que seja possível recorrer da sentença. Na Lei de Improbidade Administrativa, por exemplo, a inelegibilidade ocorre após o julgamento final, quando não há mais possibilidade de recurso. Pela regra atual, se alguém for enquadrado nas duas leis, pode ficar inelegível por décadas, dependendo do tempo que a Justiça leve para julgar todos os recursos propostos pelo réu.
 
O ministro ponderou que, se essa regra for mantida, será uma forma de condenar pessoas a ficar por décadas fora da vida pública, o que seria uma forma de cassação de direitos políticos - uma pena proibida pela Constituição Federal. Ontem, alguns ministros, como Gilmar Mendes, defenderam essa posição, mas não houve votos formais a favor da tese. Joaquim Barbosa, que também já tinha votada a favor da aplicação da lei, não compareceu ao julgamento ontem.
 
A decisão será tomada no julgamento conjunto de três ações, de autoria da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do PPS e da Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL). As duas primeiras pedem que a Ficha Limpa seja declarada constitucional, e a última pede a declaração de inconstitucionalidade de alguns artigos. Em março de 2011, o STF decidiu que a Lei da Ficha Limpa não poderia ser aplicada nas eleições de 2010, mas não declarou nada sobre a validade da norma nas eleições posteriores.
 
O plenário do Superior Tribunal Federal estava vazio, sem a presença de manifestantes. Compareceram, no entanto, representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), uma das entidades idealizadoras da lei. Ao fim da sessão, o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, que também estava no tribunal, pareceu confiante em um placar favorável à validade da lei.
 
"Estamos às portas de uma lei que iniciará a reforma política no país. A partir de agora, os partidos vão ter mais critérios para escolher seus candidatos", disse Ophir.
 
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