23/03/2017 - 15:54 | última atualização em 23/03/2017 - 15:56

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Moro volta atrás em caso de blogueiro, mas não admite próprio erro

revista eletrônica Conjur

Após duras críticas de juristas e jornalistas, o juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, voltou atrás em seu posicionamento no caso envolvendo o blogueiro Eduardo Guimarães. O blogueiro foi conduzido coercitivamente para prestar esclarecimentos à Polícia Federal sobre as informações divulgadas no seu site, o Blog da Cidadania. A decisão ignorava o sigilo de fonte garantido pela Constituição a jornalistas.
 
Moro também havia determinado uma devassa nos arquivos do blogueiro, ordenando a apreensão "de quaisquer documentos, mídias, HDs, laptops, pen drives, arquivos eletrônicos de qualquer espécie, arquivos eletrônicos pertencentes aos sistemas e endereços eletrônicos utilizados pelos investigados [sic], agendas manuscritas ou eletrônicas, aparelhos celulares, bem como outras provas encontradas  relacionadas aos crimes de violação de sigilo funcional e obstrução à investigação policial”. 
 
Ao rever sua decisão, Moro destaca a importância da manifestação de alguns jornalistas e algumas associações da classe “como elemento probatório e valorativo”. “Nesse contexto e considerando o valor da imprensa livre em uma democracia e não sendo a intenção deste julgador ou das demais autoridades envolvidas na investigação colocar em risco essa liberdade e o sigilo de fonte, é o caso de rever o posicionamento anterior e melhor delimitar o objeto do processo.”
 
Antes de Moro voltar atrás, a repercussão negativa da atitude das autoridades federais no Paraná foi tamanha que a Justiça Federal no Paraná e os membros do Ministério Público Federal que atuam na "lava jato" emitiram notas para tentar diferenciar blogueiros de jornalistas. Para eles, a existência de propaganda político-partidária no blog retiraria o caráter jornalístico do material divulgado. No entanto,  o Supremo Tribunal Federal definiu, em 2009, que "os jornalistas são aquelas pessoas que se dedicam profissionalmente ao exercício pleno da liberdade de expressão". 

Moro tenta amenizar sua responsabilidade de ter determinado condução coercitiva de blogueiro creditando o fato à insistência do Ministério Público Federal e da Polícia Federal.  “Ambos se manifestaram insistindo na quebra (eventos 37 e 47). Argumentam que, além da divulgação dos dados de investigação sigilosa no Blog da Cidadania, haveria indícios de que ele teria repassado previamente as informações aos investigados. Além disso, informam que não há elementos probatórios que apontem que referida pessoa seria de fato profissional jornalista ou que exerceria essa profissão”, disse Moro na decisão que autorizou a quebra de sigilo do jornalista.
 
O juiz federal tenta também se redimir da decisão que foi classificada como afronta à liberdade de expressão: “Certamente, não desconhece esse julgador que a profissão de jornalista pode ser exercida sem diploma de curso superior na área. Entretanto, o mero fato de alguém ser titular de um blog na internet não o transforma em jornalista automaticamente.”
 
Segundo ele, ao avaliar o blog, a existência de “propaganda político­-partidária, como banner para campanha do próprio titular do blog para vereador em São Paulo pelo PCdoB” o levou a concluir que o conteúdo do blog não seria jornalístico. “Embora a liberdade de expressão e as preferências partidárias devam ser respeitadas, não abrangem elas sigilo de fonte”, justifica.
 
De acordo com o juiz federal, também pesou na decisão o fato de Eduardo Guimarães se qualificar em cadastros públicos, por exemplo o do Tribunal Superior Eleitoral, como comerciante. “Ouvido, na data da realização das buscas e apreensões, novamente qualificou­-se como 'representante comercial' e não como jornalista”, complementa.
 
Ele garante que, em momento algum, o objetivo da condução coercitiva e das apreensões era descobrir quais eram as fontes do blogueiro, pois essas já seriam conhecidas pelas autoridades envolvidas no caso, mas sim saber se Eduardo Guimarães teria alertado investigados sobre as diligências que a PF faria.
 
Moro tenta ainda dar aula de jornalismo, dizendo como um jornalista deve agir para ser qualificado como tal, culpando o blogueiro por ter dito quem eram suas fontes aos investigadores do caso. “[Guimarães] Revelou, de pronto, ao ser indagado pela autoridade policial e sem qualquer espécie de coação, quem seria a sua fonte de informação acerca da quebra do sigilo fiscal de Luiz Inácio Lula da Silva e associados.”
 
Exclusões em série

Além de Eduardo Guimarães, também são citadas as fontes citadas pelo blogueiro, uma funcionária da Receita Federal e um jornalista. Moro diz, aliás, que se for comprovado que o jornalista atua na área, será excluído da ação.
 
O julgador também determina a exclusão do depoimento de Carlos Eduardo Cairo Guimarães como prova. “A exclusão não abrange elementos probatórios relativos à divulgação, em princípio indevida, da decisão judicial aos próprios investigados”, contrapõe o juiz federal.
 
O advogado de Guimarães, Fernando Hideo Lacerda, critica a postura de Moro no caso e destaca que não há resultado prático em retirar as provas já obtidas. “De que adianta tirar agora processo”, questiona. “Já foi violado o sigilo telefônico do Eduardo, viu com quem ele entrou em contato. Violou sigilo telemático do Francisco e da Rosicler (fontes). Já violaram tudo. Então de que adianta retirar do processo?”
 
Hideo Lacerda diz ainda que irá pedir a nulidade do depoimento de Eduardo Guimarães e a restituição imediata de tudo o que foi apreendido do blogueiro.
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