15/04/2009 - 16:06

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MinC vai acrescentar critérios ao texto que reforma Lei Rouanet

MinC vai acrescentar critérios ao texto que reforma Lei Rouanet


Do jornal O Globo

15/04/2009 - Foi o mais longo debate com a classe artística desde que o ministro Juca Ferreira começou a rodar o país para falar das mudanças na Lei Rouanet, garante a equipe que o acompanha nas andanças. Por quatro horas, na noite desta segunda, na Sala Fernanda Montenegro do Teatro do Leblon, cerca de 400 artistas e produtores culturais, como Marco Nanini, Edwin Luisi, Flávio Marinho e Ney Latorraca, conversaram e tiraram suas dúvidas com o ministro sobre a reforma da Rouanet, cujo anteprojeto de lei está sob consulta pública no site da Casa Civil. No encontro, Juca Ferreira disse "assumir publicamente" que, a pedidos da classe, vai incluir no anteprojeto de lei os critérios que a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (Cnic) utilizará para analisar os projetos que se candidatarem, pela nova Rouanet, a receber dinheiro da renúncia fiscal ou do Fundo Nacional de Cultura. A ausência desses critérios é a maior queixa dos artistas, que não querem que os parâmetros de seleção sejam especificados só depois, na regulamentação da lei.

Com a presença das secretárias municipal e estadual de Cultura, Jandira Feghali e Adriana Rattes, além da do presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, o senador Flávio Arns, o debate foi organizado pela Associação de Produtores Teatrais do Rio (APTR) e começou com a leitura de um documento preparado pela APTR para o Ministério da Cultura (MinC). Nele, o setor teatral afirma apoiar os fundos setoriais que a nova lei cria, mas deixou claro que não abre mão da garantia de 100% de renúncia fiscal que o teatro possui na lei atual (que tem só duas faixas, 30% e 100%, cada uma para gêneros artísticos predeterminados; já a nova lei cria mais faixas e acaba com essa predeterminação, fazendo com que todos os gêneros possam ser enquadrados em qualquer faixa ).


Advogado destaca imprecisões do texto

Após uma exposição do secretário executivo do MinC, Alfredo Manevy, o presidente da Comissão de Direitos Autorais da seção Rio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Sydney Sanches, citou algumas das principais dúvidas da classe artística em relação à reforma da Rouanet: "A proposta da reforma deixa muitos pontos para regulamentações posteriores. Isso cria insegurança no setor, que não sabe o que virá nessas regulamentações", analisou Sanches, destacando ainda trechos do anteprojeto de lei que poderiam dar margem à subjetividade. "No artigo 18, fala-se em "alta relevância cultural". Isso pode trazer subjetividade. Tem que estar melhor explicado no texto".

Sanches apontou também outro ponto que gera queixas de parte dos artistas: o artigo 47 do anteprojeto de lei, que determina que o MinC poderá dispor dos bens e serviços culturais financiados com recursos públicos para fins "não comerciais", "não onerosos" e "educacionais": "O que é "não oneroso"? Não sei o que é. Tem que explicar".

Além disso, a Lei de Direitos Autorais diz que os produtos incentivados pelo governo não ficarão sob o domínio dele. Ou seja, essa proposta da reforma afronta artigos da Lei de Direitos Autorais sem revogá-los.

Veio, então, a fala do ministro Juca Ferreira, que, com a pressão por critérios mais específicos de seleção de projetos, anunciou que eles passarão a fazer parte do texto do anteprojeto.

"Não estávamos especificando esses critérios justamente para não engessar o texto, para que, se quisessem modificar algo mais tarde, não tivessem que mexer na lei toda. Mas, diante do que tenho visto, pois bem: assumo aqui, publicamente, que os critérios passam a fazer parte do texto da lei", disse Juca Ferreira, para aplausos gerais da plateia.

O ministro também reconheceu que precisa melhorar a redação do artigo 47, sobre o uso, pelo governo, de bens financiados com verba pública: "Esse trecho precisa ser redigido de novo. O que quisemos dizer é que, no caso de produtos 100% financiados com dinheiro público, o governo não tenha que pagar imposto de novo na hora em que quiser usá-los numa escola pública, por exemplo. Sou totalmente a favor dos direitos autorais, quero não que eles diminuam, mas que aumentem".

A maior saia-justa do debate, porém, viria quando o ator Dudu Sandroni resolveu dizer o que pensa da reforma: para Sandroni, o dinheiro do imposto devido pelas empresas, e que é usado para o incentivo por meio da renúncia, "não é público": "É dinheiro privado! O imposto do Itaú é do Itaú! O do Bradesco é do Bradesco! É das empresas, que escolhem onde vão investir esse imposto", disse o ator.

"Você tem o direito de dar sua opinião, mas não concordo nem com as vírgulas dela", respondeu o ministro. "O governo de uma sociedade se organiza tributando a produção daquela sociedade, isso é básico. Não é interpretação, é um dado objetivo. É claro que imposto devido é dinheiro público; tanto que, quando alguém não paga, pode ir preso."

Quando o encontro se encaminhava para o fim, a atriz Camilla Amado levantou e mandou um "Gostei do senhor!", analisando que o ministro "está mais para Caetano do que para Gil". Menos entusiasmada, Guida Vianna disse que ainda precisaria "ser convencida" por Ferreira.

"O ideal é que fôssemos autossuficientes, porque, na medida em que um setor precisa de uma lei para funcionar, algo está errado. E o que está errado? Falta de cultura, de escolaridade, orçamento baixo...", disse Edwin Luisi sobre um dos obstáculos principais do MinC hoje: o orçamento de 0,6%, que ainda teve R$ 300 milhões contingenciados (congelados) pelo governo em 2009.

"Eu pedir mais verba não pode ser a novidade, a novidade tem que ser os próprios artistas se organizarem e pedirem também", sublinhou Juca Ferreira. Para Marco Nanini, "a conversa está caminhando": "É difícil mudar uma lei.Dar um canal à pluralidade de opiniões é que importa".

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