21/10/2013 - 16:00

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Magistrados e promotores debatem Tribunal do Júri

Correio Braziliense

Durante sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 7 de junho, o ministro Joaquim Barbosa fez duras críticas aos colegas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo arquivamento do caso do calouro de medicina da Universidade de São Paulo (USP), morto durante um trote em 1999. Na ocasião, a decisão impediu o julgamento dos acusados em um Tribunal do Júri. Barbosa e dois magistrados pretendiam derrubar o entendimento do STJ, mas acabaram derrotados. Irritado, ele questionou: "A quem incumbiria examinar se eles são ou não culpados? Ao Tribunal do Júri ou a um órgão burocrático da Justiça situado em Brasília?"
 
A polêmica na mais alta Corte do país ilustra o poder que a Constituição dá aos julgamentos em que a sociedade decide o destino dos acusados de crimes dolosos contra a vida. E encerra série de reportagens publicadas pelo Correio sobre a história do Tribunal do Júri na capital federal.
 
Magistrados e promotores com experiência em júri popular são unânimes em afirmar que não há melhor forma de julgar esses casos. "O povo tem um senso de justiça muito aguçado", diz Maria José Miranda, promotora aposentada que passou 20 anos acusando réus. Atuou em processos de grande repercussão, como o da morte do índio Galdino.
Alguns juristas, no entanto, criticam o fato de pessoas sem qualquer conhecimento das leis terem nas mãos tamanha responsabilidade. Isso porque não é possível recorrer de uma decisão tomada pelos jurados. "Corte nenhuma do país pode reformar a determinação do Conselho de Sentença. Ela só pode ser anulada e, assim, é convocado um novo julgamento", explica o juiz João Marcos Guimarães Silva, há sete anos presidente do Tribunal do Júri de Taguatinga.
 
Quem é acusado de atentar ou cometer crimes dolosos contra a vida -- homicídios, infanticídios, abortos e incitação a suicídio -- é submetido à avaliação de sete jurados, todos cidadãos comuns convocados ou voluntários. Diferentemente do magistrado togado, a avaliação deles será feita com base na convicção íntima. "Eles não têm as nossas amarras probatórias, que precisamos para motivar a decisão", observa Guimarães Silva.
 
O desembargador João Egmont Leôncio Lopes presidiu por mais de uma década o Tribunal do Júri de Brasília. "Como magistrado, foi a minha realização, a minha alegria, apesar de ter enfrentado temas muito pesados", lembra. Ele admite, porém, que chegou a ter preconceito em relação às sessões submetidas aos jurados. "Eu mesmo criticava. Hoje, tenho certeza de que eles julgam muito bem. Apenas uma ou duas vezes vi um erro gritante, que foi corrigido no tribunal. A pessoa havia levado um tiro pelas costas. A defesa alegou legítima defesa, e os jurados absolveram (o réu). Foi feito um novo julgamento, e ele acabou condenado", lembra.
 
 
Falhas na lei
 
Além da paixão pelo trabalho e da convicção de que os jurados têm plena condição de exercer a função, promotores e magistrados compartilham a certeza de que as leis penais brasileiras precisam de revisão. Para Maurício Miranda, titular da 1ª Promotoria de Justiça do Tribunal do Júri de Brasília, cada vez se pune menos no país. "Estão querendo acabar com a impunidade acabando com a punição", acredita. Com mais de 800 júris ao longo da carreira, Miranda participou de casos que mobilizaram e emocionaram a cidade, como o que condenou os assassinos da estudante Maria Cláudia Del’Isola.
 
No mesmo processo, aliás, atuou o desembargador João Egmont, com quem Maurício Miranda dividiu inúmeras sessões. "Aqui, no Brasil, existe a cultura da pena mínima. Para condenar o acusado um dia acima do mínimo legal, você precisa pedir licença. Toda vez que se reforma a legislação penal é para beneficiar o réu. Acho que não é isso o que a sociedade espera", avalia o magistrado.
 
João Egmont acredita que essas distorções causam a sensação de impunidade, inclusive entre os sentenciados. "Depois de acabar um julgamento, um cara condenado a mais de 100 anos de cadeia riu, debochou e nos ameaçou, a mim e ao Maurício Miranda", revela. Apesar de estar longe do Ministério Público há mais de um ano, a promotora Maria José Miranda concorda com os ex-colegas de Tribunal do Júri: "Tá cheio de gente condenada a 90 anos andando na rua. A nossa Lei de Execuções Penais é absurdamente protetiva do criminoso".
 
 
Brincadeira fatal
 
Em fevereiro de 1999, o calouro da Faculdade de Medicina da USP Edison Tsung Chi Hsueh foi encontrado morto dentro de uma piscina após um churrasco de recepção promovido pelos veteranos do curso. Quatro alunos foram denunciados pela morte do jovem, mas o processo acabou arquivado com a decisão do STF.
 
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