08/03/2017 - 18:41 | última atualização em 08/03/2017 - 18:43

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Lutas são destaque em evento comemorativo ao 8 de março

redação da Tribuna do Advogado

Foto: Bruno de Marins   |   Clique para ampliar
A Seccional discutiu na manhã desta quarta-feira, dia 8, a posição da mulher na sociedade brasileira. Na abertura do evento, a presidente da OAB/Mulher, Marisa Gáudio, afirmou que a realização do evento nesta data emblemática foi proposital: “O Dia Internacional da Mulher é histórico, momento em que a gente precisa comemorar direitos conquistados, mas ainda também falar sobre os muitos desafios que temos pela frente. A nossa intenção é trazer alguns temas e propor reflexões”.

Representando o presidente da Seccional, Felipe Santa Cruz, o coordenador das comissões temáticas e procurador-geral da OAB/RJ, Fábio Nogueira, destacou que o país atravessa um momento complicado em relação a retrocessos sociais e, por isso, é importante falar sobre não voltar atrás em conquistas sociais. “Tenho duas filhas de cinco anos e eu espero, sinceramente, que no futuro elas possam viver em uma sociedade que seja igualitária, fraterna, uma sociedade em que discursos de defesa dos interesses das mulheres saiam do papel e ganhem concretude. Espero que elas possam viver em uma sociedade muito melhor do que a que a gente vive hoje”, disse.

A secretária-adjunta da Ordem e diretora de Inclusão Digital da Seccional, Ana Amelia Menna Barreto, pontuou que é inadmissível que, ainda hoje, as mulheres recebam menos que os homens.  “A gente trabalha, e bastante. A única coisa que a gente quer é ter direitos iguais. É inexplicável que a gente tenha salários menores que os homens. Todos os dias são para comemorar e nós continuaremos trabalhando para fortalecer nossos direitos iguais. Lugar de mulher é onde ela quiser”, enfatizou.

O evento foi organizado também pela Comissão de Direito da Criança e do Adolescente (CDCA) e pela Comissão de Direito Homoafetivo (CDHO). A presidente da CDCA, Silvana do Monte Moreira, destacou que é preciso tratar crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. “Uma menina adolescente não pode ser simplesmente usada e largada, sem ter os seus direitos e sua identidade preservados. O estupro de crianças e adolescentes é uma realidade no Brasil. Lamentavelmente ainda temos essa cultura machista de que mulher, independentemente da idade, nasceu para ser usada. É contra isso que a gente tem que lutar”, disse. 

À frente da CDHO, Raquel Castro lembrou que a situação de mulheres lésbicas e transexuais é bastante complicada, já que, além da misoginia a que todas as mulheres estão submetidas, elas também precisam lutar contra a lesbofobia e a transfobia. “A luta das mulheres lésbicas e transexuais ainda está muito no início. A maior opressão que a gente vive hoje quando falamos sobre esse tema é em relação à invisibilidade. O que não é visto não é lembrado. Se você não dá visibilidade a essas pessoas elas não têm direitos. Nós mulheres ainda temos muita luta pela frente. Quando a gente fala ‘mexeu com uma, mexeu com todas’ queremos incluir mulheres heterossexuais, lésbicas e transexuais”.

Mulheres vítimas de violência

Na segunda-feira de carnaval, a bióloga Elisabeth Henschel estava em um bar na Lapa com o namorado, quando foi assediada por um homem que passava por ali. " A minha reação foi tirar satisfações com ele, que desferiu um soco no meu rosto. Ao longo do dia eu já tinha sofrido diferentes tipos de assédio. Pessoas querendo me fotografar ou me tocar sem meu consentimento, ouvi barbaridades que a gente escuta no dia a dia, mas que se intensificam no carnaval", contou. O caso de Elisabeth fez parte da estatística de que uma mulher foi agredida a cada três minutos no carnaval deste ano no Rio de Janeiro. 

Elisabeth foi ameaçada e até excluiu sua página do Facebook com medo de represálias. “Chegando aqui hoje eu senti uma atmosfera de acolhimento muito grande e estou me sentindo muito fortalecida. Nos últimos dias eu fiquei em casa acuada. Foi um sacrifício enorme ir para a faculdade ontem. E eu estou pensando até em voltar com o meu perfil do Facebook para dar visibilidade a isso. Várias mulheres vieram me procurar e me agradecer falando que elas não conseguem denunciar e eu me sinto lisonjeada sentindo esse tipo de elogio. E é muito importante a presença de homens aqui. Precisamos disseminar essas ideias por que a cultura atual é a de que a mulher é um objeto à disposição, que está na rua e que se pode fazer o que quer com ela, e não é assim que funciona”, disse.

O fotógrafo Marcio Freitas é idealizador do Projeto Nunca me Calarei, que fotografou mulheres que já passaram por algum tipo de violência. “Eu tive uma ingrata surpresa que a maioria das mulheres que eu convivo já sofreram algum tipo de assédio. Você, como homem, assim como eu, não tem ideia do que é viver assim. A gente não passa por assédio diário. Mulheres vivem uma vida de assédio”, disse.

8 de março é dia de luta

A professora Vanessa Berner, da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ e coordenadora do Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ falou sobre como o feminismo se relaciona com o Direito. Para ela, as relações de gênero, étnicas, raciais ou de classe são uma consequência das relações de poder. “É aqui que entram outras questões, como por exemplo o funcionamento do nosso sistema judicial, aquele poder do estado cuja função constitucional é a de decidir sobre as possibilidades de igualação e quebras de isonomias. Se dermos uma simples olhada nos ordenamentos jurídicos contemporâneos, perceberemos rapidamente que, na realidade, se configuram discriminando, aberta ou veladamente, as mulheres”, disse. 

Berner defende que desde a fundação da República, estruturas complexas e autoritárias de poder vêm sendo mantidas. “Isso não mudou com a Constituição de 1988. Cabe à luta feminista trazer para dentro do sistema as ferramentas para romper o patriarcalismo capitalista instalado na estrutura de poder. Nesse sentido, o conceito coletivo de mulher deve ser entendido no âmbito de sua utilidade quando se trate de definir a opressão como procedimento sistemático. Ele não é por acaso, ele é estruturado, institucional, e existe para que se possa continuar usando o Direito como instrumento de transformação social a partir do qual se normatize incorporando uma perspectiva de gênero. Só assim, dando essa virada feminista na ordem jurídica, é que as mulheres deixarão de ser objeto de direito para serem efetivamente sujeitos de direito”, defendeu.

O professor do Departamento de Ciências Humanas da Universidade Federal Fluminense (UFF) Fábio Oliveira iniciou sua fala questionando. “O que eu estou fazendo aqui? O meu texto é uma tentativa de entender o lugar que eu, como professor de filosofia, ocupo no dia de hoje”. Ele falou sobre o tema gênero e machismo. “Reconhecer os machismos presentes na filosofia implica em desvendar os corpos que ela carrega. Isso significa tirar o véu da ignorância que permanecem dia após dia sufocando novas perspectivas, que permitem uma releitura da história do pensamento ocidental fortemente marcado pela misoginia, pelo racismo, pela homofobia, pela lesbofobia, transfobia, classismo, capacitismo, especismo, entre outros. Pluralizar os espaços e dinamitar as fronteiras é papel da filosofia enquanto atividade crítica”, defendeu.

Giowana Cambrone é advogada transexual e membro da CDHO e falou sobre a feminilidade trans. “O sexo biológico é ligado à natureza. Já o gênero é uma construção social. O gênero nos acompanha como uma ditadura, desde o momento que a gente nasce até o momento que a gente morre”, disse.
 
Ela explicou que transexuais são as pessoas em que o gênero não está em conformidade com o sexo biológico. “O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo. Por outro lado, é o país que mais consome pornografia com transexuais no mundo. A expectativa de vida de pessoas trans no Brasil é de 35 anos, enquanto a do brasileiro médio é de 72 anos. A maioria das transexuais tem a prostituição como a principal profissão”, lamentou. 
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