09/10/2013 - 10:06

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Lei da ditadura para enquadrar black blocs

jornal Correio Braziliense

A ação de vândalos tem marcado a onda de protestos que começou em junho e julho, sobretudo no Rio de Janeiro e em São Paulo. Governos e forças de segurança pública buscam formas de conter os atos de violência e a depredação de bens públicos e privados sem tirar das pessoas o direito de manifestação. Depois da aprovação de leis, em diversos estados, para proibir o uso de máscaras, um antigo dispositivo jurídico ainda vigente foi ressuscitado pela Polícia Civil paulista. Na segunda-feira, um casal de mascarados detido nos confrontos no centro da cidade foram enquadrados na Lei 7.170, de 1983, conhecida como Lei de Segurança Nacional. A norma, promulgada na ditadura militar, prevê punição para quem lesar ou ameaçar a integridade territorial, a soberania nacional, o regime vigente ou os chefes dos Poderes da União.
 
Humberto Caporalli, de 24 anos, e a namorada, Luana Bernardo Lopes, de 19, foram presos ao lado de um carro da Polícia Militar, que havia sido tombado por manifestantes. Com base em fotos e vídeos gravados nos equipamentos apreendidos com os dois - embora não tenham sido flagrados auxiliando a virar o veículo -, o casal teria, segundo a PM, incentivado os atos de vandalismo.
 
Caso o Ministério Público tenha o mesmo entendimento do delegado que lavrou o boletim de ocorrência, Humberto e Luana poderão ser condenados de três a 10 anos de reclusão por "praticar sabotagem contra instalações militares, meios de comunicações, meios e vias de transporte", previsto no Artigo 15 da norma. O casal também responderá por associação criminosa, incitação ao crime, dano qualificado, pichação e posse de arma de fogo de uso restrito.
 
O uso da Lei de SegurançaNacional divide opiniões. Em nota, o grupo Advogados Ativistas, que faz a defesa do casal, lembrou que a norma não foi aplicada "nem mesmo quando dos ataques do PCC em São Paulo", em 2012. "Essa tentativa de se implantar a ordem pública através de ginásticas jurídicas é malefício incontestável para a segurança jurídica e os direitos humanos", diz trecho do documento.
 
Romualdo Sanches Calvo Filho, presidente da Academia Paulista de Direito Criminal, ressalta que a lei ainda está em vigor e, portanto, pode ser usada. "Nada impede que o Ministério Público ou mesmo o juiz entenda de outra forma, caso verifique que há excessos na acusação", ressalta o advogado criminal. Já o jurista Luiz Flávio Gomes crê que a utilização da norma "foi um erro". "A Lei de Segurança Nacional só pode ser usada quando se quer derrubar o governo, e os black blocs não querem isso. Eles são vândalos", opina. Para Gomes, o Código Penal bastaria para enquadrar os baderneiros.
 
Balas de borracha
 
Em entrevista coletiva na tarde de ontem, o secretário da Segurança Pública do estado, Fernando Grella Vieira, evitou se posicionar sobre o uso do dispositivo legal, mas anunciou que as balas de borracha voltarão a ser usadas pela PM em caso de distúrbios e depredações. O armamento havia sido proibido pelo governador, Geraldo Alckmin, em 17 de junho, logo após as primeiras grandes manifestações que abalaram o país. As balas de borracha feriram vários manifestantes, alguns gravemente.
 
Segundo Grella, no entanto, esse tipo de munição, considerado não letal, não deve ser usado contra manifestantes, mas contra "grupos de vândalos". Também foi anunciada a criação de um grupo de trabalho do governo paulista para identificar e punir os baderneiros. O trabalho será feito pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e poderá quebrar sigilos bancário, financeiro e telefônico dos suspeitos.
 
Protesto em Goiânia
 
Cerca de 300 professores invadiram ontem o plenário da Câmara Municipal de Goiânia. Em greve há duas semanas, os docentes protestam contra um projeto que altera as regras do auxílio-transporte da categoria. Segundo a Secretaria Municipal de Educação, a paralisação atinge 59% das escolas, e 70 mil alunos estão sem aulas. A prefeitura de Goiânia conseguiu que a Justiça impusesse ao sindicato multa de R$ 10 mil por dia de paralisação. Mas os docentes dizem que não vão encerrar o movimento ou desocupar o plenário da Câmara até serem atendidos.
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