25/04/2012 - 10:33

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Governo de Portugal festeja Revolução dos Cravos

site Extra Online

O processo de redemocratização portuguesa completa 38 anos nesta quarta-feira com alguns dos principais responsáveis por ele decididos a abandonar às comemorações oficiais. Militares da reserva e civis célebres tentam, com suas ausências, pressionar o atual governo, que julgam desrespeitar a Constituição e contribuir para rebaixar Portugal de nação soberana para mero "protetorado".
 
Desde junho de 2011, o país é comandado por uma coligação entre o Partido Social Democrata (PSD), de centro-direita, e o Centro Democrático e Social (CDS), de direita. O governo anterior, do Partido Socialista, caiu após o premier José Sócrates ser o terceiro líder europeu a solicitar a intervenção externa do FMI por causa da crise do euro.
 
A coligação, então, tornou-se a responsável por implementar - em meio ao adverso contexto econômico do continente -, o programa de austeridade definido em conjunto com o fundo, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu. Uma missão por si só com um elevado custo social, mas que o atual governo estaria na visão dos críticos se empenhando em tornar mais elevado, inclusive tomando medidas tecnicamente inconstitucionais.
 
"Neste momento há o desemprego que chegou ao 14% (no quarto trimestre de 2011; em 2007 a média foi de 9%) e que pode subir mais. Há pessoas até a passar fome. Isto é um fato e está na lógica contrária do que foi a política depois do 25 de abril (de 1974, quando os militares tomaram o poder dando início à redemocratização)", diz em entrevista ao jornal O Globo Mário Soares, primeiro presidente eleito diretamente após a derrubada da ditadura salazarista.
 
Soares é o principal nome civil a abandonar as comemorações e dá mais peso político ao protesto, iniciado pelos militares revolucionários representados pela Associação 25 de Abril (A25A). Na segunda-feira, o órgão presidido por Vasco Lourenço - um 9 dos membros do Conselho da Revolução - divulgou um comunicado cancelando a já prometida participação nas solenidades que vão ocorrer na Assembleia da República nesta quarta-feira.
 
"A linha política seguida pelo atual poder político deixou de refletir o regime democrático herdeiro do 25 de Abril configurado na Constituição da República Portuguesa", diz o texto. "O nosso estatuto real é hoje o de um 'protetorado', com dirigentes sem capacidade autônoma de decisão nos nossos destinos." Por isso, a associação "não participará nos atos oficiais nacionais evocativos do 38.º aniversário" e estará presente nos eventos "populares" - deixando clara a postura anti-governamental do protesto.
 
O premier Pedro Passos Coelhos minimizou as recusas dos convites como uma mera busca por holofotes da oposição. Mário Soares fundou, ainda no exílio, o Partido Socialista. Além disso, outro político a negar participação nas comemorações oficiais foi Manuel Alegre, também membro histórico do partido.
 
"Estou habituado a que ao longo dos anos algumas figuras políticas queiram assumir protagonismo em datas especiais. Esta data especial não pertence ao governo, pertence ao povo e ao país. Cada um assume as suas responsabilidades", disse ao jornal português "Público".
 
Um membro do Ministério da Defesa Nacional afirmou que não se espera que os militares da ativa adiram ao protesto dos revolucionários da reserva.
 
Umo dos primeiros sinais expressivos do descontentamento com a situação do país e da mobilização cívica dele decorrente ocorreu ainda no governo Sócrates. Em março de 2011, entre 200 mil e 300 mil pessoas ocuparam o centro em uma das maiores manifestações na história recente do país.
 
O evento foi promovido pelo que ficou conhecido como "geração à rasca" - formada por desempregados e trabalhadores precários, sobretudo jovens - e resultou no Movimento 12M. Tempos depois, houve uma aproximação com a Associação 25 de Abril. Os militares da reserva ligados a ela e os enrascados passaram a realizar eventos conjuntos, trocando experiências sobre como "promover e sustentar a mobilização" e debatendo o "aprofundamento da democracia".
 
No comunicado emitido na terça-feira, a associação afirma que "as medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável" e conclama "o Povo português e a todas as suas expressões organizadas para que se mobilizem e ajam, em unidade patriótica, para salvar Portugal, a liberdade, a democracia."
 
Apesar da maior ativididade política dos cidadãos, Lisboa está longe de repetir os cenários de confrontos de Atenas, entende António Costa Pinto, ex-presidente da Associação Portuguesa de Ciência Política e professor da Universidade de Lisboa e do Instituto Universitário de Lisboa.
 
"Portugal não teve movimentos mais radicais como a Grécia por enquanto. Isso explica-se pelo fato de as centrais sindicais, controladas pelos partidos, sobretudo o comunista, desempenharem um papel de ocupação do espaço de protesto", diz.
 
E se a pergunta é se há chance de um novo levante, a resposta de Costa Pinto é "não" com ressalvas. Ao mesmo tempo em que as declarações de Soares, como fundador do Partido Socialista, são um apelo às áreas mais à esquerda da legenda, o abandono das comemorações oficiais pelos revolucionários é também um recado à caserna.
 
"Essa posição da associação também deve ser percebida como um apoio à corporação militar que sofreu também corte salarial de salarial em média de 25%, além da austeridade em relação ao próprio orçamento da Defesa. É também uma posição corporativa dos militares".
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