30/05/2014 - 09:19

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Elogiado por colegas da Corte, Barbosa é criticado por entidades

jornal O Globo

As opiniões a respeito do comportamento de Joaquim Barbosa variam de acordo com os interlocutores. Para alguns colegas de Supremo Tribunal Federal (STF), ao menos publicamente, Barbosa é um homem decente e preparado. Para entidades que representam os magistrados, o tom é outro: o ministro seria autoritário e antidemocrático.
 
Sem a presença de Celso de Mello, ministro mais antigo do STF, coube a um notório desafeto de Barbosa, Marco Aurélio Mello, fazer o discurso oficial de despedida do presidente da Corte na sessão plenária da tarde de ontem. Não houve na fala dele grandes elogios ao colega, ao contrário do que comumente é visto quando alguém se aposenta do tribunal. Mas ele lembrou a atuação de Barbosa como relator do processo do mensalão e afirmou que o presidente ficará conhecido por isso.
 
"Veio a ser relator de uma ação penal importantíssima no que o Supremo, como colegiado, acabou por reafirmar que a lei é para todos indistintamente", disse Marco Aurélio.
 
Antes, em entrevista ao Globo, Marco Aurélio criticou a decisão do colega de deixar o cargo, mas ressaltou que compreendia os motivos pelos quais Barbosa pediu a aposentadoria. "Eu não concebo que se virem as costas a uma cadeira no Supremo. Eu, por exemplo só vou sair na undécima hora, com cartão vermelho, vai pra casa. Agora, ele tem um problema de saúde muito sério. E talvez por isso esteja deixando. Meu Deus do céu, ele é um homem de quantos anos? questionou Marco Aurélio, fazendo referência ao fato de Barbosa ainda estar longe de completar 70 anos, quando os ministros são obrigados a se aposentar".
 
O ministro Luís Roberto Barroso, que já foi alvo de duras críticas de Barbosa em julgamentos, elogiou o colega e disse que as discussões com o presidente foram todas proveitosas. "O ministro Joaquim é um sujeito decente, preparado, eu, pessoalmente, o admiro, independentemente de pensarmos de modo diferente em muitas coisas. Bastar-se a si mesmo é a maior solidão, já dizia Vinícius de Moraes, o que enriquece a vida da gente é outro, quem pensa diferente da gente", disse Barroso.
 
Já o ministro Luiz Fux, o mais próximo do presidente, lamentou a saída do colega e elogiou a forma como ele conduziu as decisões no STF: "Nos processos subjetivos, decidia tecnicamente muito bem. Nos processos objetivos, onde havia um desacordo moral razoável na sociedade, ele procurava ser democrático, ouvir os valores da coletividade. É um homem que vai fazer falta no Supremo Tribunal Federal".
 
Ao se pronunciar durante a sessão, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, considerou a decisão de Barbosa "incorreta" mas agradeceu a atuação como ministro. "Fica aqui um protesto pela saída prematura e o agradecimento do Ministério Público brasileiro pelo comportamento de vossa excelência como membro do Ministério Público e ministro desta corte. Ao ver do Ministério Público, é uma incorreta decisão de se ausentar de maneira antes do tempo deste honroso cargo. Sinta-se com o dever absoluta e totalmente cumprido", disse Janot.
 
Fora do STF, as palavras foram ácidas. O presidente da Associação dos Juizes Federais (Ajufe), Nino Toldo, praticamente comemorou a aposentadoria precoce de Barbosa. A entidade foi uma das que bateu de frente com o presidente do STF. "Ele não vai deixar saudade para a magistratura. Era uma pessoa autoritária, antidemocrática, pelo menos como presidente do STF e do CNJ, enquanto acompanhei. Um presidente do STF tem que saber dialogar, e para ele era muito difícil. Por vezes era desrespeitoso", disse Toldo.
 
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) caracterizou o período de Barbosa à frente da Corte como de "déficit democrático" Em nota, assinada pelo presidente Luiz Schmidt, a entidade afirma: "Para a Anamatra, a passagem de Sua Excelência pelo Supremo Tribunal Federal e pelo CNJ não contribuiu para o aprimoramento do necessário diálogo com as instituições republicanas e com as entidades de classe, legítimas representantes da magistratura, marcando, assim, um período de déficit democrático"
 
Para o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos Costa, o ministro tem um estilo de atuar. "A gestão dele teve coisas positivas e negativas. Tivemos um momento de bastante visibilidade da Justiça brasileira, que revelou o Judiciário à sociedade. Um aspecto de certa forma negativo foi a falta de diálogo com os demais poderes e com a magistratura". André Bezerra, presidente Associação Juizes para a Democracia (AJD), afirmou que o ministro virou celebridade. "Isso não foi culpa dele, mas ele foi alçado, durante o julgamento do mensalão, à condição de celebridade, o que no Judiciário pode atrapalhar a independência e a parcialidade dos julgamentos".
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