08/09/2011 - 15:01

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Editorial O Globo: Círculo vicioso

jornal O Globo

Sai governo, entra governo e uma questão crucial para o país que não consegue deslanchar: a reforma tributária. O nó górdio está na dificuldade de se conciliar os interesses das unidades da federação, muito heterogêneos, com grandes diferenças de patamar de desenvolvimento.

No segundo mandato do governo Lula, o Ministério da Fazenda chegou a negociar uma proposta de reforma com o Congresso, que tinha como principal mérito a tentativa de simplificação do ICMS. Por recomendação dos secretários estaduais de finanças, o governo abandonou a ideia inicial de instituir um novo imposto de valor agregado, e optou por reformular o próprio ICMS, alterando a incidência do tributo da origem para o destino, com algumas exceções. Porém, estados produtores temiam ser prejudicados, e surgiu assim um impasse, pois a promessa do governo federal de compensar, temporariamente, qualquer perda, não soou convincente.

Nenhuma proposta melhor apareceu no horizonte e, diante da dificuldade de se promover uma reforma mais ampla, o governo tem caminhado por mudanças pontuais. Para desonerar a folha de pagamentos, está em teste um projeto piloto que transfere ao faturamento o cálculo da contribuição previdenciária patronal. Com isso, espera-se que setores que empregam grandes contingentes de mão de obra sejam beneficiados no futuro. Outra mudança pontual é a ampliação da faixa de enquadramento do Simples (cogita-se estender esse sistema para atividades econômicas ainda não atendidas).

Tais mudanças e desonerações não têm evitado um aumento da carga tributária. Em vários tributos, sejam eles municipais, estaduais ou federais, a arrecadação vem crescendo bem acima da média da economia, em termos reais. Explicações para esse fenômeno vão desde mais eficiência da máquina arrecadadora e formalização dos negócios à dinâmica da própria economia.

No entanto, o mais provável é que esse comportamento decorra da estrutura dos impostos, que embute um efeito cascata. Assim, quando a economia se acelera, a arrecadação cresce mais rapidamente. E o resultado é que a fatia de tributos aumenta como proporção do Produto Interno Bruto (PIB).

Mas por que então não se muda essa estrutura inadequada? A explicação está no lado das despesas. O setor público no Brasil não se esforça para que seus gastos cresçam menos que a média da economia e, para financiá-los, é preciso que as receitas se expandam em igual ritmo. Cria-se assim um círculo vicioso.

Uma simplificação dessa estrutura certamente daria mais eficiência à economia como um todo, com possibilidade de ampliação do investimento privado (e até do setor público, pois a arrecadação continuaria a crescer). Politicamente tem sido difícil pôr em prática tal mudança, e acaba ficando tudo como está, com apenas alguns curativos.

A demanda por gastos públicos sempre supera o clamor por redução da carga tributária, o que leva políticos e governantes a defender, por exemplo, a recriação da CPMF, sob pretexto de que a Saúde precisa ser financiada com recursos adicionais.

Sem a quebra desse círculo vicioso, entrará governo, sairá governo, e efetivamente o país ficará sem uma verdadeira reforma nos tributos.
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