16/10/2014 - 18:31 | última atualização em 17/10/2014 - 11:53

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Comissão da OAB/RJ critica divulgação de identidade de suspeito de ebola

redação da Tribuna do Advogado

A comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ divulgou nesta quinta-feira, dia 16, nota criticando a divulgação, por meio dos órgãos de imprensa, da identidade do paciente suspeito de ter contraído o vírus ebola a partir da notificação do serviço de saúde da cidade de Cascavel, no Paraná.
 
Segundo o texto, profissionais e estudiosos da bioética e biodireito ficaram surpresos com a veiculação de dados pessoais e documentos, além da foto do paciente, mesmo sem que o diagnóstico tivesse sido confirmado. Para eles, o fato de se tratar de um solicitante de refúgio no Brasil torna ainda mais grave a situação.
 
Leia a íntegra da nota, assinada pelo presidente da Comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ, Bernardo Campinho, e pela integrante do grupo Renata Camile Carlos Reis.

Nesta semana o Brasil assistiu, por intermédio dos órgãos de imprensa, ao caso do paciente suspeito de ter contraído o vírus Ebola a partir da notificação do serviço de saúde da cidade de Cascavel (PR). Para surpresa nossa - profissionais e estudiosos da bioética e biodireito -, imediatamente parte da imprensa brasileira passou a divulgar os dados pessoais, o documento, além da foto do paciente, mesmo com diagnóstico não confirmado. O paciente é um solicitante de refúgio no Brasil, o que tornou a divulgação ainda mais gravosa.
   
Não temos ciência sobre o autor do fornecimento das informações aos órgãos de imprensa, tampouco sobre o(s) responsável(is), na imprensa, pela efetiva divulgação. No entanto, mesmo com a difusa autoria dos dados, em nossa avaliação, preceitos éticos basilares foram maculados, sejam eles por profissionais de saúde, por autoridades migratórias ou mesmo por jornalistas. A divulgação de tais dados se deu ao arrepio da legislação brasileira (especialmente em relação à Lei 9.474/1997, que implementa o Estatuto do Refugiado, e à Lei  6.259/1975, que estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças, entre outros temas), mas também confronta a confidencialidade que deve marcar a relação médico-paciente, o necessário sigilo que deve acompanhar os procedimentos das autoridades migratórias, além de infringir o próprio Código de Ética dos Jornalistas, que arrola entre as obrigações do profissional de imprensa o respeito ao direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão.
 
A Comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ repudia com veemência a divulgação dos dados e a exposição pública do paciente. Acreditamos que as autoridades brasileiras, tais como o Ministério Público, devem agir imediatamente no sentido de investigar responsabilidades dos atores envolvidos e apresentar denúncia, bem como amparar e reparar o paciente que sofre as consequências da divulgação. Lembramos que a repercussão do caso e a forma como o paciente foi tratado já reverbera no aprofundamento do preconceito e da xenofobia infelizmente plasmada na sociedade brasileira, tornando ainda mais vulneráveis os solicitantes de refúgio no Brasil – especialmente os de origem africana.
 
Rio de Janeiro, 16 de outubro de 2014
 
Bernardo Brasil Campinho
Presidente da Comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ
 
Renata Camile Carlos Reis
Advogada integrante da Comissão de Bioética e Biodireito da OAB/RJ
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