15/02/2017 - 17:30 | última atualização em 15/02/2017 - 17:54

COMPARTILHE

Aula magna da ESA lota plenário da Seccional

redação da Tribuna do Advogado

Foto: Bruno Marins  |   Clique para ampliar
Iniciando o ano de atividades da Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB/RJ, o juiz titular da Vara de Execuções Penais do Amazonas, Luís Carlos Valois, ministrou aula magna sobre a crise no sistema carcerário brasileiro nesta quarta-feira, dia 15.

O diretor da ESA, Sérgio Coelho, destacou a importância de reunir tantas pessoas, entre advogados e estudantes, para debater o assunto, que veio à tona principalmente depois das rebeliões no Amazonas e no Rio Grande do Norte, em janeiro deste ano. “É muito bom ver esse auditório lotado de pessoas querendo pensar o Direito e discutir este tema que atualmente é o mais urgente no país”, disse. 

Também compuseram a mesa o juiz presidente do I Tribunal do Júri do TJ/RJ, Alexandre Abraão, o presidente da Comissão de Processo Penal da OAB/RJ, Diogo Tebet e o vice-diretor da ESA, Fernando Cabral Filho.

Valois é mestre e doutor em criminologia e Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP) e falou de maneira crítica sobre o Judiciário e o direito penal. “O Judiciário brasileiro é um judiciário policial. Estamos formando uma sociedade em que o Judiciário é mais um instrumento da polícia”, defendeu. Segundo ele, isso é resultado da política de guerra às drogas, que impregnou todo o processo penal. “Até jurisprudências do próprio Supremo Tribunal Federal levam a encarcerar mais pessoas. O Judiciário tem medo de soltar pessoas, mesmo que isso esteja na lei”.

Como exemplo, ele cita a jurisprudência de que policiais podem ser testemunhas do fato, mesmo que não estejam presentes. Valois destaca que segundo o Código de Processo Penal, as testemunhas devem ser as mais próximas do fato e, portanto, é inadmissível que pessoas sejam presas apenas com a palavra de um policial que nem presenciou o fato. “O processo deveria averiguar o fato e não a ocorrência policial”. 

Segundo Valois, o mundo jurídico vive em falsidade. “O sistema penitenciário está lotado por causa da guerra às drogas. Formam-se padrões. O da prisão é a sujeira, a desumanidade. E o do Judiciário é o de não ver essa sujeira. O Judiciário brasileiro é um mundo à parte, que se chama de corte e palácio, e não conhece a realidade das pessoas que está julgando. E faz parte do Direito encobrir essa realidade. O Judiciário é muito bem tratado e os juízes são muito bem pagos para sequer falar sobre a realidade”.
Ainda sobre o papel do juiz, ele afirma que no imaginário popular, a função deste é a de prender. “Uma sociedade que fica feliz com a prisão dos outros não pode ser uma sociedade sadia”, afirmou. Ele defendeu que as faculdades de Direito formam profissionais insensíveis à realidade, “Faltam discussões sobre filosofia, sociologia e sobram repetições de leis”.

Para ele, o discurso da ressocialização é um dos motivos para o abandono do sistema penitenciário. “Muito fala-se da superlotação das prisões e o Judiciário delega este problema para o Poder Executivo. Mas é preciso assumir a própria culpa em relação ao super-encarceramento”. Ele contou que ao pesquisar para a sua tese de mestrado, identificou que 60% dos acórdãos que usavam o termo “ressocialização” o utilizavam para aumentar a pena. “Os manuais de Direito Penal dizem que as prisões vieram para humanizar. Mas, de que forma se nas cadeias acontecem todo o tipo de assassinatos medievais?”, questionou. 

Para concluir, ele leu um texto sobre a rebelião no Complexo Penitenciário de Manaus, que deixou 56 detentos mortos. No texto, Valois relatou a situação que encontrou e o desespero de ver vários corpos sem vida e esquartejados. Ele explicou que, ao contrário da maioria das rebeliões, os presos de Manaus não pediam melhorias, a rebelião teve o intuito de executar outros presos. “O sistema penitenciário é um deposito de gente. Aquilo não é humano”, reforçou.
Abrir WhatsApp