19/03/2010 - 16:06

COMPARTILHE

Artigo: Videoconferência com presos - Maíra Fernandes

Videoconferência com presos


Maíra Fernandes*

O interrogatório é um dos momentos mais importantes para a defesa do réu. É através de sua fala - ou de seu intencional silêncio - que ele pode influir, de modo decisivo, no convencimento do juiz e, consequentemente, no julgamento da causa. Uma postura segura e sincera, um olhar, um gaguejar, uma lágrima, um mero movimento corporal podem dizer a um magistrado experiente e sensível muito mais do que todo o escrito em folhas de papel.

Durante o interrogatório, o juiz tem a oportunidade de conhecer o réu, de observar suas condições físicas e mentais.  Além disso, a realização do interrogatório presencial representa aos réus presos um momento único para denunciar eventuais maus-tratos sofridos no cárcere, o que, decerto, jamais fariam perante seus algozes.

Por tudo isso, a Lei 11.900/09, que inseriu no Código de Processo Penal brasileiro a possibilidade de interrogatório por videoconferência - inclusive para "responder à gravíssima questão de ordem pública", cujo significado lei alguma é capaz de esclarecer - viola princípios constitucionais garantidores de um processo penal justo e equilibrado, tais como a ampla defesa, o contraditório, o devido processo legal e a isonomia, além de contrariar a Convenção Americana de Direitos Humanos (Decreto 678/92), que assegura ao réu o direito de ser ouvido, pessoalmente, por um juiz. 

Assim, estando o réu sob a custódia do Estado, é deste o dever de viabilizar, com segurança, o seu deslocamento, salvo em casos realmente excepcionais, como o de enfermidade. Afinal, como poderá o magistrado, a quilômetros de distância e separado do réu por telões, cabos e fios, perceber - com o grau de certeza necessário para se condenar ou absolver um indivíduo criminalmente - se o réu está ou não sendo pressionado, se mente ou diz a verdade, se há algo mais a ser dito?
Celeridade processual e economia de verbas públicas são relevantes, mas não podem se sobrepor, jamais, às garantias individuais, sobretudo no processo penal, onde está em jogo a liberdade.


*Maíra Fernandes é advogada criminal e integrante do Conselho Penitenciário pela OAB/RJ

Artigo publicado no jornal O Dia, 19 de março de 2010

Abrir WhatsApp