05/05/2010 - 16:06

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Artigo: Aspectos ambientais dos royalties - Flavio Ahmed

Aspectos ambientais dos royalties


Flávio Ahmed*

O recente acidente envolvendo vazamento de óleo no Golfo do México por uma plataforma na British Petroleum, já  antecipando uma das maiores catástrofes ambientais pela indústria do petróleo, nos traz luzes para, do ponto de vista ambiental, refletirmos sobre a Emenda Ibsen e sua proposta de alteração da divisão dos royalties. Ela traduz uma realidade que o sistema jurídico brasileiro contempla e que hoje se quer suprimir.

E qual é essa realidade? Ora, o petróleo é um recurso natural e possui a natureza jurídica de bem de uso comum do povo, conforme art. 225 da Constituição. É certo que o uso do hidrocarboneto acarreta consequências para toda população, que também usufrui dos benefícios decorrentes do uso de energia por ele propiciada e dos materiais que dele se originam.

Contudo, não há que se confundir o uso que se faz desse bem, que é estendido a toda a população, aos gravames que decorrem de sua exploração, que incidem topicamente e são suportados diretamente por aqueles mais propriamente expostos aos riscos que dela provem. Aqueles, em cujas áreas próximas são realizadas as prospecções, ficam sujeitos e expostos aos reflexos dessa atividade potencialmente poluidora, que é a extração e beneficiamento do óleo in natura. E o exemplo com o qual abrimos nossa exposição bem ilustra o que aqui pretende se afirmar, além de outros como o caso histórico da Exxon no exterior e aqui no Rio no vazamento de óleo na Baía de Guanabara (processo nº 200200124568).

Ciente dessa situação, o legislador constitucional previu no art. 20º, § 1º aos entes federados a "participação no resultado da exploração do petróleo e gás natural", através da forma de royalties (terminologia embora inadequada, mas que não compromete a ratio). A previsão constitucional é, portanto, clara e alegar que o fato de ser extraído no mar aboliria essa obrigação não nos convence.

Aos royalties e participações especiais, aplica-se o princípio do usuário-pagador do direito ambiental, já que o uso dos recursos naturais e seus efeitos não podem representar um ônus a mais para os estão sujeitos à exploração da riqueza, ou como afirma Henri Smetz pois "quem causa a deterioração paga os custos para prevenir ou corrigir." É certo também que as atividades advindas da exploração do óleo acarretam o aumento do fluxo populacional para as cidades produtoras e, via de regra, imprescindíveis necessidades de investimentos em infraestrutura.

Com a exploração vem a riqueza, mas com ela os riscos inerentes à exploração, ao transporte do óleo, a perda de qualidade de vida, sobrevindo igualmente os impactos no turismo e na saúde da população diretamente exposta.

Mas não é só. Um retrospecto nos remete ao fato de que já na Lei Federal nº 7453\/85 havia sido estabelecido que tais recursos deviam ser aplicados em energia, pavimentação, abastecimento de água, saneamento e meio ambiente, capitulando como de natureza indenizatória de tais verbas, o que reforça sua destinação, que veio sendo ratificada pela legislação infra constitucional posterior, embora com particularidades, seja em relação a royalties ou participação especial (Lei nº 9478\/95). O próprio idealizador do texto atual desta lei já destacou esse aspecto.

É certo também que os investimentos em meio ambiente com a mudança das regras contidas na Emenda Ibsen cairiam de aproximados R$ 300 milhões para R$ 5 milhões, segundo declaração da Secretária de Ambiente do Estado, com inegável impacto no Fecam (Fundo Estadual de Conservação Ambiental) inviabilizando vários projetos ambientais, maltratando a pródiga natureza do nosso Estado que fornece não só a mata atlântica, rios, praias, mas também o óleo que faz pulsar o desenvolvimento.

Evidentemente que se subtrai do Rio a contrapartida financeira que lhe permite, do ponto de vista ambiental, mitigar os impactos dessa atividade potencialmente poluidora, cujos benefícios são auferidos por toda a população brasileira, mas cujos males da sua exploração são arcados, exclusivamente, por aqueles expostos aos seus riscos diretos, acabando por se gerar uma distorção.

Não se pode olvidar a potência ambiental que é o Rio de Janeiro e quão importante é a preservação do meio ambiente natural, artificial, cultural no nosso Estado, preservação essa capaz de trazer recursos para o país como um todo.

Um golpe no Rio, além de ofender a Constituição, ofendendo também princípios reitores do direito ambiental, traz conseqüências nefastas não só à população do Estado, mas aos brasileiros na medida em que expõe a riscos, sem contrapartidas, um patrimônio ambiental sem igual e cuja depreciação afeta a todos, não só do ponto de vista econômico, mas principalmente humano.

Se subtrai do Rio a contrapartida financeira que lhe permite, do ponto de vista ambiental, mitigar os impactos dessa atividade potencialmente poluidora, cujos benefícios são auferidos por toda a população brasileira, mas cujos males da exploração são arcados por aqueles expostos aos seus riscos diretos.

*Flávio Ahmed é presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB/RJ

Artigo publicado no Jornal do Commercio, 5 demaio de 2010

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