Apesar da crise, Judiciário pressiona Executivo para receber R$ 7,4 bilhões Do jornal O Globo 25/01/2009 - Alheio à crise econômica, o Judiciário continua elevando seus gastos com pessoal acima dos demais poderes e pressiona o Executivo para receber passivos de até R$ 7,4 bilhões. A soma equivale às demandas apresentadas à equipe econômica, que ainda não foram incluídas no Orçamento e, para serem pagas, dependem de crédito suplementar. Os passivos se referem ao pagamento de auxílio-moradia para juízes de primeira instância e de adicionais salariais para servidores como tempo de serviço, quintos e incorporação da diferença de 11,98% da URV. Na maioria, esses passivos decorrem de decisões administrativas do próprio Judiciário, que não passaram pelo Congresso, mas não podem ser contestadas pelo Executivo, devido à independência dos poderes. De 2003 a 2008, os gastos com pagamento de pessoal do Judiciário cresceram 117,6%, enquanto a inflação no mesmo período, medida pelo IPCA, ficou em 48,9%. No caso do pagamento do auxíliomoradia, o impacto estimado nas contas públicas é de R$ 2,1 bilhões. Uma medida administrativa do Conselho da Justiça Federal concedeu aos juízes federais do país o pagamento de auxílio-moradia retroativo ao período de setembro de 1994 a dezembro de 1997. O benefício foi estendido aos aposentados que estavam em atividade na época, aos pensionistas e aos magistrados trabalhistas, valendo até para quem morava e trabalhava na mesma cidade. Parte do Judiciário já recebeu o benefício; a pressão maior agora é dos magistrados da Justiça do Trabalho. O pagamento de quintos reivindicado pelo Judiciário terá um impacto estimado de R$ 3,8 bilhões no Orçamento. Trata-se de um adicional pago no passado aos funcionários que exerciam cargos comissionados ou de confiança. O benefício foi suspenso pela lei 8.112, de 1990, mas houve contestações na Justiça. Uma medida provisória de 2001 acabou com a gratificação, mas abriu brecha para a incorporação retroativa do benefício relativa ao período de abril de 1998 a setembro de 2001. O Judiciário concluiu que a gratificação retroativa era devida e, em 2005, o Conselho da Justiça Federal autorizou a incorporação dos quintos aos salários dos servidores, ficando o pagamento condicionado à disponibilidade orçamentária. Outra demanda se refere a um adicional por tempo de serviço e deve custar R$ 301 milhões. Quando foi definido o teto salarial de R$ 24.500 para o Judiciário, algumas instâncias 55f continuaram pagando o adicional por tempo de serviço por fora do teto. O Conselho Nacional de Justiça considerou o pagamento inconstitucional, mas decidiu que os servidores não precisariam devolver a diferença paga indevidamente. O Judiciário decidiu ainda que estenderia o benefício a todos os seus servidores. Quanto à diferença da URV, o impacto estimado nas contas públicas é de R$ 1,2 bilhão. Esse passivo refere-se à incorporação da diferença de 11,98% relativa a uma parte da inflação não considerada na conversão dos salários pela URV, no lançamento do Plano Real, em 1994. "Não fomos nós que fizemos a crise", diz coordenador Essa diferença foi paga aos juízes e magistrados, mas ainda não foi incorporada aos salários dos servidores administrativos. A equipe econômica não comenta o tema. Em conversas reservadas, técnicos mostram preocupação com impacto dessas demandas nas contas públicas. A articulação do Judiciário com o governo para o pagamento dos passivos está sendo conduzida principalmente pelos presidentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), César Asfor Rocha, e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Rider Nogueira. Como o montante de recursos é muito grande, o pagamento deve ser feito em parcelas. O pagamento dos passivos tem mobilizado as entidades que representam os servidores do Judiciário. No dia 10 de dezembro, a Federação Nacional da Justiça Federal (Fenajufe), em parceria com sindicatos, enviou e-mails para servidores chamando para o "Dia Nacional de Lutas pelo Pagamento dos Passivos". A ideia era realizar atos públicos em seus locais de trabalho. "Esse é o melhor momento para a categoria se mobilizar e pressionar os tribunais regionais em defesa do pagamento dos passivos", dizia a mensagem. Ramiro López, um dos coordenadores da Fenajufe, espera que o pagamento ocorra este ano. "A cúpula do Judiciário estava fazendo essa negociação com o Executivo. Mas o governo ganha argumento porque neste ano tem crise econômica. Mas não fomos nós que fizemos a crise", afirma. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, não está envolvido nessa negociação. Para ele, a prioridade é ver aprovado este ano o projeto de lei que aumenta o salário dos ministros do STF de R$ 24.500 para R$ 27.250. Se o reajuste para ministros do STF for autorizado, todos os magistrados do país receberão aumentos proporcionais, gerando um impacto de R$ 105,4 milhões por ano nos cofres públicos.