03/04/2012 - 10:15

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Aluno se recusa a rezar e caso vai para a direção

jornal Folha de S. Paulo

Uma professora de geografia de uma escola estadual de Minas Gerais resolveu iniciar as suas aulas rezando o pai-nosso com todos os alunos. Um deles, ateu, decidiu manter-se em silêncio.
 
Ao notar a reação do estudante, ela lhe disse, segundo o relato do aluno, que "um jovem que não tem Deus no coração nunca vai ser nada na vida". O aluno se irritou, os dois discutiram, e o caso foi parar na diretoria da escola.
 
O Estado brasileiro é laico e a Constituição, tal como o estatuto do magistério, proíbe discriminação religiosa.
 
A Secretaria de Estado da Educação de Minas apura se houve infração da professora. A secretaria disse nesta segunda-feira, dia 2, tê-la orientado a não rezar mais em sala de aula.
 
O caso ocorreu há duas semanas na escola estadual Santo Antonio, em Miraí, cidade de 13,8 mil habitantes que fica na Zona da Mata, a 335 km de Belo Horizonte.
 
Uma inspetora regional responsável pela escola disse que a professora foi "mal interpretada" e que sempre tinha o "hábito" de rezar.
 
Quem discutiu com a docente foi Ciel Vieira, 17, ateu há dois anos. "Eu disse que o que ela fazia era impraticável segundo a Constituição. E a professora disse que essa lei não existia". Lila Jane de Paula, a professora de Ciel, não quis falar com a reportagem.
 
Ciel, cuja mãe autorizou que ele falasse com a Folha, afirmou ter pedido para a professora parar, sentindo-se humilhado. Lila o instou, diz, a levar um juiz à sala de aula.
 
"Ela não me pediu desculpas." A resistência à oração o fez ser vítima de bullying de colegas, afirma - disseram que ele era "do demônio".
 
O garoto gravou parte da oração e pôs no YouTube, sob o título "Bullying e Intolerância Religiosa". No vídeo, é possível escutar o som do pai-nosso. Ao fim, ouve-se: "Livrai-nos do Ciel", em vez de "Livrai-nos do mal". "Foram colegas de classe", diz.
 
Avisada, a mãe de Ciel foi à escola. Segundo ela, Lila se justificou dizendo que, ao falar que "o jovem que não tem Deus nunca vai ser nada na vida", quis, na verdade, falar que o jovem não seria nada "espiritualmente".
 
"Meu filho sempre foi um aluno ético. Até chorei quando vi o vídeo dele", disse a mãe, que é espírita e não quis dizer o nome. Ficou acertado com a escola que a professora não daria mais a primeira aula para Ciel - assim, ele não teria que ouvir o pai-nosso. "Resolveram o meu problema e jogaram o resto para de baixo do tapete", disse.
 
A ONG Ação Educativa condenou a prática. Um professor público tem de ser neutro, diz. "As orações nas escolas públicas ocorrem desde sempre, à revelia da lei", diz Daniel Sottomaior, presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos.
 
A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), indicou dom Tarcisio Scaramussa para falar à Folha, mas ele não foi encontrado.
 
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