05/10/2018 - 10:45 | última atualização em 05/10/2018 - 11:59

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#30AnosdaCF88: Advogados refletem sobre o futuro da Constituição

redação da Tribuna do Advogado

           Foto: Lula Aparício  |   Clique para ampliar
 
Clara Passi
Em discurso neste mesmo dia 5 de outubro de 30 anos atrás, data exata da promulgação da Constituição Federal, o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães, admitiu: “A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa ao admitir a reforma”. E determinou: “Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca”.
 
Os deputados e senadores levaram a orientação do Senhor Constituinte ao pé da letra. De 1988 para cá, foram feitas 99 emendas aos 250 artigos do texto, que trataram de temas como: reeleição para presidentes, governadores e prefeitos (1997), reforma do Judiciário (2004), fim do voto secreto para cassação de mandato de deputados federais e senadores (2013), direitos dos empregados domésticos (2013), aumento de 70 para 75 anos a idade da aposentadoria compulsória para ministros de tribunais (2015) e a imposição de limite por 20 anos ao crescimento dos gastos públicos à inflação do ano anterior (2016), a chamada PEC do Teto de Gastos Públicos.
 
Todas essas Propostas de Emenda à Constituição (PEC) tiveram de ser debatidas em comissões especiais e aprovadas em duas votações na Câmara e no Senado. Para vigorarem, precisaram de três quintos dos votos (308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores).
 
Foto: Bruno Marins   |   Clique para ampliar
Pois é justamente essa abertura à revisão unida à cautela do Supremo Tribunal Federal para interpretar cláusulas pétreas o elixir da juventude da CF, sustenta o presidente da Comissão de Processo Constitucional da OAB/RJ, Rodrigo Brandão. Para ele, o fato de a Carta ser um amálgama de ideologias distintas também é um poderoso mecanismo de autopreservação. “Isso confere muita maleabilidade para comportar regimes de governos de orientações diversas, o que se comprovou de 1988 para cá. Isso me dá esperança de que dure o máximo possível e que ainda vigore em 2048”, diz o advogado.
 
Ela blinda o cidadão contra o exercício arbitrário do poder do Estado através de uma proteção sólida de liberdades fundamentais.
Rodrigo Brandão
Entusiasta do documento que marcou a redemocratização do país, Brandão observa que esta Constituição conseguiu ter mais força normativa do que todas as que a antecederam. "É muito mais aplicada no cotidiano dos tribunais, na administração pública. Ela blinda o cidadão contra o exercício arbitrário do poder do Estado através de uma proteção sólida de liberdades fundamentais, tem uma preocupação séria com direitos sociais que a alinha ao liberalismo igualitário”.
 
O momento de exacerbação política, no entanto, coloca-se como ameaça à perenidade não só da lei máxima do país, mas dos valores do constitucionalismo, alerta o advogado, que se diz preocupado com a ascensão de um poder radical (de direita ou de esquerda) nestas eleições.
 
“Essa história absurda de que direitos humanos são para proteger bandido tem se difundido na sociedade. Propostas de superação das garantias processuais com base no argumento genérico de efetividade do processo também são muito perigosas”, alerta ele, ponderando que, por outro lado, a tentativa de controle da imprensa também ameaça a democracia.
 
"Torço para que esse clima se dissipe após as eleições”.
 
Foto: Bruno Marins   |   Clique para ampliar
Presidente da OAB/RJ, Felipe Santa Cruz colocou-se frontalmente contrário à reforma trabalhista, uma proposta do governo Temer aprovada em 2017. A reforma, que alterou profundamente a CLT, foi entendida pela advocacia e pela magistratura trabalhistas como uma ameaça de precarização de direitos previstos na Constituição. De forma análoga, Felipe se opôs ao projeto governista de mudar as regras previdenciárias, o que demandaria alterações na CF.
 
Esses movimentos denotam, na visão do presidente, uma afronta a um dos principais sustentáculos desta Constituição: a proteção social ao trabalhador. "Para garantir mais 30 anos de sobrevivência da Carta, é preciso um esforço para conter projetos de ocasião, elaborados a toque de caixa e reprovados pela grande maioria dos cidadãos".

 
Para garantir mais 30 anos da Carta, é preciso um esforço para conter projetos de ocasião, elaborados a toque de caixa e reprovados pela maioria dos cidadãos
Felipe Santa Cruz
 
“De forma açodada, pouco democrática e até truculenta, sem aprofundar a discussão com a sociedade, o governo federal e setores do Congresso tentam fazer com que os trabalhadores paguem a fatura da estagnação econômica, demolindo direitos sociais conquistados ao longo da história e sedimentados na Constituição com sangue, suor e lágrima”, diz ele, que defende uma reforma política que venha a permitir o resgate da ética e da representação democrática.
 
Brandão faz eco ao anseio de Felipe por uma reforma política, de forma que os partidos sejam mais abertos à sociedade civil e que se permita o surgimento de novas lideranças, um desejo antigo da população.  Se fosse dado a ele o condão de aprimorar alguns pontos do texto de 1988, Brandão aliviaria a sobrecarga sobre os estados e municípios.
 
“Há sobre estes um rol de competências muito extenso, relativas, por exemplo, à segurança pública e à educação com recursos financeiros insuficientes. É preciso reformar a federação de forma a equilibrar as atribuições”, explica ele.
 
A CF teria também de ser mais incisiva na redução da desigualdade social e promover o combate à criminalidade que equacione processos penais que terminem em tempo razoável com observância às garantias fundamentais dos indivíduos, finaliza o presidente da Comissão de Processo Constitucional. 
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